segunda-feira, 3 de março de 2008

Esquecimento - Dois caminhos

Fechando os olhos vou esquecendo...

a imagem anterior fica momentaneamente gravada na minha memória,

mas por momentos estagna a minha castidade racional.

É bom fechar os olhos, é bom desprezar por instantes a nossa faculdade de pensar,

e tornarmo-nos autómatos da nossa mente, vaguear por meandros questionáveis,

percorrermos atalhos inalcançáveis, buscando e encontrando destinos que julgávamos não conhecer.

Afinal o que somos? E a que “vagão” pertencemos?

Ao que realmente podemos ainda que penosamente influenciar,

aquele que nos permite usar a tal faculdade racional, ainda que de forma condicionada?

O vagão que juramos, todos a pés juntos, pertencer porque cá temos tudo e porque tudo podemos controlar?

Ou pertencemos antes, ao mundo das sete vidas, aquele que rotineiramente alcançamos, quando subitamente fechamos os olhos...

e ao qual caímos por não podermos mais?

Esse incontrolável, inconsolável  e ilógico universo onde convergem os mais profundos e inexplicáveis distúrbios e de onde heroicamente saímos sempre bem, voltando na jornada seguinte mais vigorosos que nunca.

É como se fossemos e viéssemos, prosseguíssemos e regredíssemos, ainda que quando por altura do regresso...

tudo volte à mesma forma, tudo esteja igual à altura que decidimos interromper o percurso.

Mas esta é uma viagem especial, pagamos o preço do tempo, damos por nós e quanto mais percorremos mais pesados ficamos, mais entorpecidos nos sentimos.

A responsabilidade vai fazendo troça de nós, rindo da nossa fragilidade...

A novela, essa, continua...os protagonistas não. 

A noite é vazia e fria, escura e despejada.

Talvez por isso mesmo, todos optem por gostar de pertencer ao vagão da luminosidade, do brilho e do fulgor.

Porém a futilidade do dia, o fluxo da correria e da ligeireza, a ânsia bruta pela cópia,

tiram e voltam teimosamente a retirar, o brilhantismo, a transparência e o aspecto límpido ao vagão de preferência.



 «O que rezas e o que me dizes silenciosamente?

Que coragem me suplicas, quando o desencanto se habitua, e eu, já, não te consigo ouvir?»


Prefiro pertencer à facção minoritária, caber no povoado da diferença,

deixar que não seja eu a controlar o rumo das coisas, eliminando também a possibilidade de outros o fazerem.

Tendo, porém, a convicção que o brilho das estrelas suplanta o aspecto tenebroso da existência corpórea,

e a certeza que a leviandade do quotidiano controlado pela faculdade racional não invada,

a pureza da humilde noite.

Prefiro, enfim, pensar que o espírito das gentes é capaz de terminar melhor a narração de suas vidas, que a fatal faculdade de elas pensarem.

Fechar os olhos é bom…


«Mais não te consigo dar...leva, tudo, o que de mim restou!»

«- Mas diz-me, porque me olham esses olhos escuros e preguisos?

Porque choras, tu, assim ?

- Choro, porque já não te sinto vida…choro porque deste lado já não sou eu.»

2 comentários:

Anónimo disse...

Vi a ilustração de "Esquecimento-Dois caminhos" antes de ti e, sem saber que seria com esse fim, o de ilustrar este magnifico "apontamento", percebi logo de momento o seu significado, porém as palavras completam-no e valorizam-no!Profundo...Parabéns!*

Anónimo disse...

john, como prometido cá estou eu a comentar e mais importante, a ler o teu blog. Sim, que para ler qualquer coisa escrita ou publicada por ti tenho de vir à net, já que não tenho direito ao teu minguado livro... é a vida, antigos amigos lol

Acerca do texto, parece que te tou a ver a recitar isto...é mesmo a tua cara joe!

Parabéns, escreves muitíssimo bem!!!

Queria dizer mais umas coisas, mas já fui avisado que coisas más eram imediatamente apagadas, portanto fico por aqui...não, à boa maneira de john de la Riffah, quero acrescentar que este texto é muito exequível lolol

Parabéns! beijinho*